ca·rác·ter |át ou áct|
(latim character, -eris, sinal, marca)
i) O que faz com que os entes ou objectos se distingam entre os outros da sua espécie.
ii) Marca, cunho, impressão.
iii) Qualidade distintiva.
iv) Índole, génio.
v) Dignidade.
"carácter", in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa
É impressionante a quantidade de pessoas com mau carácter com que nos cruzamos durante uma vida. Tendo mesmo a afirmar que estas são em maior número que as restantes, as pessoas com bom carácter, as bem formadas, as chamadas “boas pessoas”.
Os indivíduos “mau carácter” deveriam andar identificados com placas para que não restassem dúvidas sobre a sua índole, para que pudéssemos escolher, sem surpresas, o que esperar deles. O problema, o grande problema que se coloca, é que estas pessoas andam por aí, mascaradas de cordeirinhos mansos, misturadas na multidão, como todos nós e entre todos nós. E o trabalho é todo nosso, de estarmos atentos a atitudes e sinais e de, com inteligência e perspicácia, percebermos quando estamos perante um exemplar desta espécie. O que me chateia é todo o trabalho envolvido, o tempo despendido com pessoas que ao fim de algum tempo se revelam autênticas maçãs podres.
Mau carácter não são palavras mal escolhidas, ideias mal passadas ou mal entendidos. Mau carácter não são atitudes menos boas, porque essas, infelizmente, todos vamos tendo de vez em quando. Ninguém se livra da sua quota-parte de saídas infelizes e atitudes incorrectas e irreflectidas, daquelas que nos causam arrependimento logo a seguir. Mau carácter não são dias menos bons que nos fazem ser menos simpáticos e agradáveis com o mundo. O mau carácter revela-se em atitudes premeditadas que vão causar desconforto no outro, revela-se em intrigas, revela-se em jogos do mal, com fins egoístas. O mau carácter apanha-se em pequenas ações, repletas de maldade e azedume. O mau carácter está repleto de desonestidade e deslealdade para com o outro, faltas de respeito, esconderijos e falsidade.
Mas até aqui, ainda poderíamos ficar confusos, sem conseguir distinguir a verdadeira natureza das intenções. Até que surge o próximo passo: a forma como consertamos os disparates que fazemos. Pois é, o mau carácter distingue-se também pela forma como resolvemos as asneiras que fazemos. O mau carácter não se arrepende, não se esforça por consertar, o mau carácter nem sequer se apercebe, muitas vezes, do problema causado, porque do seu ponto de vista não há nada de errado. É a diferença (estrutural) de pontos de vista entre o bom e o mau carácter. Não vêm as situações da mesma forma, não falam a mesma língua, não se regem pelo mesmo código. O código de conduta humana.
O mau carácter anda (quase) sempre mascarado, dissimulado. É raro encontrá-lo escancarado, de pré-aviso. O mau carácter tem ainda inflamada a particularidade (brilhante!) de ser moralista, cheio de julgamentos e regras que impõe a quem o rodeia mas raramente aplica a si próprio. O mau carácter desilude porque, quase sempre, não estamos à espera dele. As pessoas com bom carácter esperam sempre o melhor das restantes, não é assim? O que muitas vezes não se verifica. Quem nunca se cruzou com verdadeiros (e vincados) maus caracteres? Infelizmente, todos nós, mais cedo ou mais tarde, contactamos com este género.
O mau carácter é estrutural, fica para sempre. É um traço de personalidade. Por isso, quando suspeitarem que estão perante um exemplar destes, o meu conselho é um: fujam.
P.s.- Um elogio ao bom carácter, às boas pessoas, aos bons corações. Cada vez mais raros entre nós.